Em uma quinta-feira estupidamente ensolarada, sem nuvens, típico em Goiânia.
O problema do Dia de Não Sair da Cama, é que ele não é marcado, acontece quando menos se espera e só percebemos quando quase tudo dá errado a partir do momento em que saímos dela. Como operários honestos*, cristãos, capitalistas e cheios de contas para pagar que somos, estamos condicionados a chamar qualquer pressentimento do tipo "não saia da cama" de preguiça, a não ser que estejamos doentes ou de férias mesmo. Então, se não saímos da cama sentimos algum arrependimento do tipo "está um dia lindo lá fora para fazer negócios e eu aqui curtindo preguiça, cheio de contas para pagar". Só mesmo quando saímos percebemos que realmente era nosso Dia de Não Sair da Cama.
*"Honesto" no parágrafo acima significa: trabalho para ganhar o dinheiro que mereço e estudo mais para um dia ganhar mais trabalhando menos.
Simples assim?
Parecia simples: levantar da cama, acender a luz, ligar a cafeteira, tomar um banho quente. Levantar da cama foi difícil, como já estou esperta nisso coloquei o celular para despertar 1h30 antes do necessário. Parece idiotice, mas meu corpo se sente muito bem com a sensação: "tenho mais 1h30 para descansar, aproveite!"
Levantei da cama, acendi a luz, acendi, a luz, acendi a luz, luz, acendi, a, a, luz? Não, desisti! Não tinha energia elétrica quando acordei. Infelizmente não foi nenhuma surpresa. Inventei de me mudar para um prédio em obras: um dia chego e não tem água, no mesmo dia acordo e não tem luz. Minha relação com meu prédio tem sido como a relação de uma mulher apaixonada que apanha do marido: quando está apanhando diz que vai largar ele, mas quando está tudo bem ela esquece a surra que levou porque ele é o homem da vida dela. A comparação é cretina, mas perfeita.
Voltando ao marido, digo, ao apartamento sem luz, não tive como fazer café porque minha cafeteira não funciona com pilha. Liguei para meu pai para avisar que eu trouxe a conta de energia elétrica da casa dele sem querer e como estava vencendo eu paguei, também contei para ele que estava sem luz (na hora eu estava tão fula da vida que só agora, escrevendo o post, notei a ironia do destino). Tomei um banho frio e rápido e saí de casa para uma reunião com uma cliente, com prazo de sobra para tomar café-da-manhã no Centro.
O que eu fui fazer no Centro?
Já no Centro (ou Setor Central, como queira) e depois de me alimentar com café-com-leite e pão-de-queijo em uma lanchonete da Avenida Araguaia, segui rumo à Rua 4, onde eu tinha o compromisso. Chegando lá, resolvi pegar a agenda na bolsa para olhar o endereço. Abri a bolsa e ao "ver o vazio" dentro dela me lembrei que a agenda estava em casa, em cima da cama ou da cadeira, mas estava em casa.
Olhei o histórico do meu celular para ver o número da cliente, mas me lembrei que a cliente tinha ligado no fixo, não no celular. Os telefones dela eu só tinha anotados na agenda de papel, que ficara em casa. Como ela também é cliente da loja onde meu pai trabalha, liguei para ele perguntando se por acaso ele não tinha o número. Não, não tinha. =(
Então pensei "perdi a viagem". No fundo tinha perdido mesmo, mas sou pão-dura demais para admitir que tinha desperdiçado dois sit-pass (R$ 4,00) em uma viagem improdutiva ao poluído Setor Central. Nesse momento eu percebi que era meu Dia de Não Sair da Cama, mas já que estava lá, resolvi fazer algumas coisas produtivas como pagar a mensalidade da pós-graduação e comprar uma geladeira.
Delírio de uma manhã ensolarada
Sempre comprei à vista, acho uma BURRICE ficar comprando tudo em prestações, crediário, cartão de crédito. As pessoas que colocam tudo em crediário acabam ficando escravas do cartão porque trabalham para pagar o que já estão devendo, terrível. Se for para pagar prestações que seja de um lote, uma casa própria, um veículo zero ou qualquer outro investimento. Eletrodomésticos e móveis, por exemplo, são bens que realmente não merecem ser adquiridos em prestações, mas da geladeira estou precisando muito mesmo. Então eu resolvi tentar comprar com crediário ou cartão da loja, mas graças a Deus não consegui.
Entrava nas lojas olhando os preços das máquinas de lavar e dos refrigeradores, mas em uma delas eu resolvi fazer o cartão para comprar uma TV LCD. Geek de uma figa eu sou: precisando de refrigerador, máquina de lavar, microondas, fogão e o que eu quase compro é uma TV LCD, o que do ponto de vista profissional não é tão absurdo, já que seria um investimento só para dois objetivos: televisão para ver noticiários locais e monitor decente para meu computador.
Enquanto o vendedor lento calculava as prestações minha consciência voltou e eu disse que ía comprar um refrigerador ao invés da TV de 19 polegadas. Demorou muito para o vendedor (que não tinha muita familiaridade com o software da loja) calcular o meu plano. Eu ía pagar uma entrada na hora e o restante em suaves prestações. Na hora em que eu fui pagar o boleto não foi gerado, apareceram mais prestações do que o vendedor tinha falado e depois de mais de uma hora saí da loja sem comprar a geladeira e com a consciência tranqüila. Afinal, era meu Dia de Não Sair da Cama, então melhor não ter comprado mesmo, se tivesse pago poderia ter acontecido algo pior como entregarem a geladeira errada ou até mesmo entregarem no endereço errado, vai saber. Então decidi que vou comprar uma geladeira em um prego e à vista.
Especialização
Depois do estresse causado pela burocracia que é tentar comprar um eletrodoméstico em suaves prestações, fui direto para o ponto de ônibus. 1, 2, 3, 4, 5 segundos esperando e me lembro que tenho que pagar a faculdade, então é melhor aproveitar a viagem. Cheguei na faculdade pedindo o boleto. Não, não tem boleto. Tem que pagar à vista e aqui. Vocês não aceitam cartão de débito Visa? Perguntei só porque sou brasileira e não desisto nunca, mas eu já sabia que não. Ela disse que eu poderia pagar até o dia 13, mas eu lá sei qual gasto imprevisto e urgente pode surgir até lá, então é melhor pagar logo o que tem ser pago.
Ponte que partiu! Para chegar lá eu passei pelo shopping, onde tem caixa eletrônico, mas não me lembrei de sacar o dinheiro primeiro. Lamentável, mas aceitável, afinal era meu Dia de Não Sair da Cama. Vocês fecham para almoço? Não? Então daqui a pouco eu volto. Fui ao shopping e os dois caixas eletrônicos do meu banco pelo qual a empresa me obriga a receber meu salário estavam fora de serviço. Como eu disse um palavrão quando vi o segundo caixa inoperante, uma mulher que estava com uma criança - que vergonha! disse um palavrão totalmente desnecessário perto de uma criança - me disse que na Lotérica dava para fazer saque. Desconfiei, já que sempre faço saque do meu banco em Lotérica, mas nunca tinha feito do banco pelo qual a empresa me obriga a receber meu salário.
Mais dinheiro no ralo
Assim que chegou minha vez de ser atendida na Lotérica uma tia de Brasília ligou no celular pedindo o telefone do meu pai. Como eu estava sem a agenda de papel e não sei os telefones do meu pai de cor, acabei desligando ela sem querer enquanto procurava o telefone do meu pai, não que eu seja noob no funcionamento de um Nokia, mas porque eu estava nervosa com a possibilidade das pessoas da fila começarem a gritar comigo ou coisa do tipo. Em um Dia de Não Sair da Cama é bom estar emocionalmente preparada para o pior.
Na Lotérica perguntei se era verdade que sacavam daquele banco. Sim. Fiz o saque do valor exato para pagar a faculdade. Quando peguei o comprovante li serviço tarifado. Perguntei para a atendente se aquilo era mesmo cobrado e ela confirmou que era "um real e pouquinho". Ponte que partiu! Se eu soubesse tinha ido ao banco. O banco é bem longe, mas quem me conhece sabe que eu iria mesmo. Já parei caixa das Lojas Americanas por 15 minutos por causa de R$ 0,03. Não admito que cobrem de mim qualquer centavo que não tenha sido pré-combinado e se for para economizar eu ando, ando mesmo.
Chega!
Não, não aconteceu mais nada de bizonho durante a manhã. Paguei a faculdade, de lá fui para o meu restaurante favorito. Do restaurante fui para o ponto de ônibus, onde finalmente curti um pouco de sombra tomando um Tampico gelado.
Foi sem querer
- Deixei muita comida no prato do Restaurante Cidadão. Eles realmente colocam muito arroz para todo mundo, mas eu geralmente consigo "rapar o prato", hoje eu não consegui. Realmente não cabia mais. Sinto muito! Odeio desperdício de comida, ainda mais do que pagar taxas que eu não sabia para bancos.
- Nunca mais deixar a agenda em casa. Que mico!
- Nunca mais tentar abrir crediário ou coisa do gênero sem levar um comprovante de endereço, ou seja, depois que receber a primeira conta do telefone. Não que eles desistam de abrir por eu não levar, mas porque demora muito se o vendedor não for muito habilidoso e ficar um tempão tentando consultar o CEP.
- Nunca mais ficar batendo perna no Centro de Goiânia sem sombrinha. Eu fico insuportavelmente mais mal-humorada sob o sol quente. O céu azul, limpo e sempre ensolarado de Goiânia é lindo para quem olha da sombra, para quem está caminhando sob esse lindo céu é auto-flagelação.
- Deixar a garrafa térmica sempre cheia de café, preparada para as próximas manhãs em que não vou ter energia elétrica em casa.
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